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O meio ambiente como estorvo

Atualizado: 19 de dez. de 2022

O jornalismo investigativo como agente transformador na cobertura de questões socioambientais



Fabiana Ghazale


Ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles visitando plantação ilegal na Amazônia. (imagem: reprodução/Tchélo Figueiredo)


As investigações jornalísticas sobre temas socioambientais na Amazônia, especialmente aquelas que tratam de práticas ilegais e violações de direitos, são frequentemente realizadas por jornalistas da região sudeste do país, onde estão localizadas as principais redes de comunicação. Isso se dá justamente pela falta de segurança, pois os profissionais que vivem e são conhecidos nas comunidades estão mais expostos a riscos do que os que passam pouco tempo naquela região e já estão em outro local quando sua reportagem é publicada.

Para um governo que transformou a Amazônia em uma terra sem lei, que abriga setores suspeitos do agronegócio, ampara os garimpeiros ilegais, e enxerga a demarcação e proteção das terras indígenas como impasse ao agronegócio, o trabalho de jornalistas naquela área incomoda, pois denuncia e escancara os esquemas de corrupção, tornando evidente problemáticas com pouco espaço na mídia tradicional, entre elas o ecocídio de um dos maiores biomas do planeta e a demissão em massa de funcionários públicos por simplesmente cumprirem seu papel de fiscalização ambiental.


O objetivo dessa matéria consiste em evidenciar a importância da atuação do jornalismo investigativo acerca de questões socioambientais, com enfoque na reportagem “O meio ambiente como estorvo”, produzida pelo jornalista Bernardo Esteves para a revista Piauí. Através de trabalhos como esse, é possível revelar o abandono dessa região, e o quanto o meio ambiente está sofrendo pelos ataques permanentes dos poderes econômicos e políticos, vigorosamente apoiados e até mesmo protagonizados pelo governo.


O MEIO AMBIENTE COMO ESTORVO


A reportagem “O meio ambiente como estorvo”, de Bernardo Esteves da Costa, da revista Piauí, recebeu Menção Honrosa em Produção Jornalística em Texto no Prêmio Vladimir Herzog, de 2019. Nela, é retratada a barbárie praticada pelo então ministro do meio ambiente Ricardo Salles e incentivada pelo presidente Jair Bolsonaro, que garante a impunidade de quem destrói a Amazônia.


Revela-se, ainda, um enorme desrespeito à Constituição e um mercado que oscila entre a exaltação do agronegócio e o temor das sanções internacionais pela destruição da floresta. Narrada em primeira pessoa, o jornalista entrevistou 29 funcionários públicos, entre eles o ex-ministro do meio ambiente, reconhecido como o porta-voz dos interesses do agronegócio em detrimento da defesa do meio ambiente.


Além disso, o processo investigativo trouxe à tona a perspectiva de um corpo técnico escorraçado por cumprir a lei ambiental. “No relato exposto na abertura da reportagem, em que um funcionário olha para os lados com medo de estar sendo perseguido por agentes, ele pediu que eu usasse um aplicativo que não veja rastros das conversas, esse clima de medo me impressionou muito”, lembra Bernardo.


Entre os funcionários públicos entrevistados, José Olímpio Augusto Morelli, fiscal do Ibama, contou que acabou sendo exonerado após flagrar Jair Bolsonaro pescando numa área marinha protegida na baía de Angra dos Reis. Durante a reportagem, relatos como esse trazem credibilidade através do retrato mais próximo da realidade dos elementos investigados, evidenciando práticas arbitrárias do governo.

Ao final da nossa entrevista, Bernardo ressalta a importância de sua ação investigativa. "Fica pra mim muito clara a importância de você ter ferramentas para entender quais são os caminhos de atuação desse governo para a governança ambiental. No meu entendimento, as ferramentas do jornalismo investigativo são fundamentais para a caracterização da atuação do governo, bem como a coleta de dados que trazem à tona práticas ilegais”, afirma ele.


NOVO CONGRESSO AMEAÇA A AMAZÔNIA


O resultado das eleições de 2022 no Brasil tornou-se um risco iminente para a preservação da Amazônia. O Partido Liberal (PL), por exemplo, legenda do presidente Jair Bolsonaro, elegeu 99 nomes e conquistou a maior bancada da Câmara dos Deputados. Um deles é justamente o ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, eleito deputado federal por São Paulo, apesar de seu passado de afronta à proteção ambiental e de incentivo à devastação da natureza.


Apesar disso, nomes fortes entraram na Câmara para impor resistência. Esse é o caso da líder indígena Sônia Guajajara, do PSOL, e da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, da Rede Sustentabilidade, ambas eleitas deputadas federais por São Paulo. Marina traz para o Congresso o respeito internacional e a experiência como ministra que ajudou a diminuir em 80% o desmatamento no país, contrastando com o perfil do Ricardo Salles, reconhecido por seu apoio à degradação do meio ambiente.


A jornalista Jaqueline Sordi, coordenadora-adjunta de comunicação da rede Observatório do Clima define esse cenário como “hostil às pautas ambientais”. Entretanto, demonstra esperança diante do comprometimento do presidente eleito. “Numericamente não houve grande alteração na correlação de forças no Congresso.Então, quem irá determinar se as pautas ambientais avançam ou não será a presidência. Se Lula cumprir as promessas de campanha, o cenário é promissor”, declara.


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