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"O Jornalista e o Assassino"uma discussão sobre ética jornalística e relação com a fonte

Ana Clara Silva


Foto: Ana Clara Silva


“Qualquer jornalista que não seja demasiado obtuso ou cheio de si para perceber o que está acontecendo sabe que o que ele faz é moralmente indefensável. Ele é uma espécie de confidente, que se nutre de vaidade, da ignorância ou da solidão das pessoas.”- Janet Malcolm, em "O Jornalista e o Assassino"

Publicado originalmente em 1990, “O Jornalista e o Assassino” é um livro-reportagem escrito por Janet Malcolm. A escritora americana realiza um estudo sobre o caso do jornalista Joe McGinniss, que foi processado pela sua fonte, o médico Jeffrey McDonald, acusado de assassinar a própria esposa e suas duas filhas. Além de ter feito grande sucesso na época da publicação, o livro de Malcolm ainda é amplamente usado em aulas de jornalismo, como forma de abrir uma discussão sobre a ética que um jornalista deve seguir.


Durante a obra, a autora apresenta entrevistas e partes do julgamento do processo, tanto da defesa de McGinniss quanto da de McDonald. O livro deixa em aberto a discussão sobre o quão grave foram as ações do jornalista e as consequências delas para o jornalismo da época.


O início da história


Após ser acusado de assassinato, Jeffrey McDonald entra em contato com diversos jornalistas, a fim de mudar a visão das pessoas sobre si e provar sua inocência através de um livro. Depois da maioria ter recusado a proposta, ele fecha um contrato com o jornalista Joe McGinniss. Durante todo o processo de escrita, além de deixar a entender que escreveria positivamente sobre ele no livro - o que não acontece - McGinness fica bem próximo de Mcdonald, sua fonte, desenvolvendo uma relação de amizade. Porém, Joe escolhe traí-lo, retratando o médico no livro como um cruel assassino. Assim começa o processo McDonald x McGinniss.


Ética


No posfácio, a autora é indagada sobre a diferença entre ficção e não-ficção. E ela responde da seguinte maneira: “O escritor de ficção tem direito a mais privilégios. Ele é dono da sua própria casa e pode fazer nela o que quiser. (…) O escritor de não-ficção tem com o leitor um contrato que o obriga a limitar-se a eventos que ocorreram de fato e às personagens que tenham equivalentes na vida real, e que não permite que ele enfeite a verdade sobre tais eventos ou personagens.”


Entre os muitos erros de McGinniss, um dos mais graves foi agir como um escritor de ficção. O jornalista se deixou levar pelo desejo de lançar um best-seller e inventou uma narrativa sobre a noite do assassinato, onde McDonald é descrito como um assassino psicótico sob efeito colateral de um remédio para fome, o que é completamente diferente do relato de Jeffrey, e que acredita-se que possa ter sido o maior motivador para o processo. O escritor quebrou a maior regra do jornalismo: o compromisso com a verdade.


Durante o julgamento, McGinniss apresentou a visão de dois escritores em sua defesa, Wambaugh e Buckley. Ao ser questionado sobre se um escritor deve ou não revelar suas opiniões às fontes, Wambaugh afirmou que isso nunca pode ser feito, pois tal fato poderia encerrar comunicações posteriores. Além disso, admitiu contar inverdades as suas fontes, mas nunca mentiras, o que levantou o questionamento da diferença entre os dois, que ele esclareceu com a frase: "Uma mentira é algo não verdadeiro que é dito com intenção malévola ou má-fé; enquanto uma inverdade é parte de um mecanismo mediante o qual pode-se alcançar a verdade de fato".


Segundo o pensamento de Wambaugh, para conseguir melhores informações, às vezes é necessário que o jornalista conte pequenas inverdades para sua fonte e concorde com opiniões que não condizem com seus ideais, mas não pode ser nada prejudicial à relação de confiança que é formada entre os dois. O é pensamento questionável, já que segundo o código ético jornalístico não é permitido nenhum tipo de mentira ou inverdade. Joe McGinniss, ao enviar íntimas cartas que afirmavam acreditar na inocência de McDonald e se tornar muito próximo dele, ultrapassou o limite da inverdade e começou a ter intenções ruins com isso, se tornando uma mentira, uma vez que essa traição prejudicou McDonald publicamente.


Dessa forma, o livro deixa o pensamento de qual é o verdadeiro limite dessa inverdade, até onde um jornalista pode omitir suas verdadeiras opiniões e intenções para manter a fonte? Qual é o limite de proximidade que o escritor deve manter com seu personagem?


Todo jornalista corre o risco de ser mal interpretado e deixar sua fonte insatisfeita, como foi caso da própria Janet Malcolm, que um pouco antes de lançar o livro “O Jornalista e o Assassino”, foi processada por Jeffrey Masson, por uma falta de interpretação do psicanalista, que afirmava que a autora havia atribuído a ele declarações errôneas. A escritora cita o caso no posfácio e deixa claro que a motivação para escrever o livro não tem relação com seu próprio processo, como muitos acreditaram

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